quinta-feira, 6 de outubro de 2011

O Silêncio Final das Coisas

Passos na escada da igreja.
O momento sentido de não sentir,
Angústia... Ao meio-dia
Ia, ia, ia...

Chove.
Enquanto lá fora Augusto fala com os Anjos,
Os sinos da matriz badalam em silêncio o passar das horas.
Nada muda. Cala a voz da natureza.

Não haverá fim menos trágico do que não acabar?
Acabamos esperando, eternamente pelo que há de vir
Pelo ar, nos poros, ou ouvidos,
Na alma pobre, absurdamente vazia.

Oco.
Sem que saibam, a saída está liberada,
E o momento é de partir,
Mas voltaremos a mesmo lugar,
Enquanto o estômago dói de fome,
Fome de pensar, fome de ouvir.

Grito.
Eco ecoa...
Ninguém responde.
O silêncio grita em resposta,
E então eu me calo, com a boca vazia.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Implosão

O meu castelo de papel desmoronou,
E a poesia esvaiu-se no ar...
Ruíram os meus sonhos numa implosão metafísica.
Nada sobrevive ao fim.

Cansado, os olhos secos agoniza na longa espera...
Espera, que a fila não andou e você está no fim!
O fim... Fim, sem hora para acabar.
Mas o meu castelo de papel desapareceu.

Na história escrita nele não sobrará migalhas a ser contadas,
Nem saberão que nas janelas ali desenhadas esteve alguém a pensar,
E a dura poesia concreta, feita de tijolos e braços,
Suor e lágrimas,
Desmoronou junto com os nossos sonhos.

Não chores! A vida é mesmo assim...
Tudo acaba, tem seu fim.
Amanhã é sábado e talvez, sei lá,
A gente voa e volta para cá.

Estou na lona, deitado, caído, desmoronado.
No castelo sem andares,
Sonhos amontoados, quebrados, destroçados,
Um a um, sem lágrimas, sem lástimas!
Entulho poético.

Lixo!
Para que se embriagar de tristeza,
Enquanto se enche a cara de vinho,
Órfão, sem teto metafísico?

terça-feira, 14 de junho de 2011

Ator - O Poeta da Ação

A Poética da Voz tem como enfoque a idéia de transformar a voz cotidiana, superando-a, fazendo com que a musicalidade da voz seja também produtora de sentidos.

Tal poética vocal não é estritamente técnica. Está mais ligada aos processos criativos, e depende da coesão entre a organicidade e a técnica. Falar é um gesto, uma vibração do corpo, que parte de um desejo com um determinado objetivo. A Voz é é também uma ação física, um gesto do corpo, e deve estar em harmonia com o restante deste corpo, trabalhando sinergicamente.

O bom músico afina diariamente seu instrumento musical e o manipula, buscando ainda mais a precisão na hora de executar sua arte, e assim o ator deve fazer com o seu corpo. “Afinar” o corpo e a voz não é simplesmente fazer exercício físico, aquecimento vocal ou cantarolar notas musicais, mas explorar corpo e voz em sua totalidade, compreendendo os seus limites, suas potencialidades... E a partir daí criar uma música corpórea, sonora, preenchida de silêncio, sentimento e significados.

Para Burnier (2001) " o ator é o poeta da ação". E a Poesia é uma ação extra-cotidiana, como toda a forma de Arte.  Mas que é uma ação "Extra-Cotidiana". Por exemplo: Os que podem andar fazem isto sem nenhum esforço psicológico, e na maioria das vezes, sem muito esforço físico. Quando alguém diz para uma outra pessoa para esta andar para que ele possa ver, esta pessoa que antes andava com "naturalidade" passa a ter dificuldades de realizar uma ação totalmente cotidiana. Por que isto acontece? Oras, porque a representação é uma ação "Extra-Cotidiana", da qual a maioria das pessoas não possui Consciência das próprias ações cotidianas, e por isto não saberão representa-las. Daí a importância da Consciência de si e das possibilidades do seu instrumento de trabalho: O Corpo. 

Esta afinação se dá através da consciência e de si e do outro. E é através desta afinação de nosso instrumento de trabalho - o corpo - que podemos executar ações extra-cotidianas, nos deixando em estado de alerta e prontidão cênica.

Este Colorido vocal é busca de uma voz que fuja da cotidianidade, do senso comum, da monocordia, como fosse uma música de uma nota só ou sem vida. Esta poesia, que transcende o estado comum, é simplesmente uma exemplificação de uma ação Extra-cotidiana, que se faz presente na presença cênica, na respiração, no corpo e na voz.

A desmontagem do corpo cotidiano significa, no limite, tornar acessível a experiência da "não-forma", do silêncio. O corpo informe se mantém no fluxo contínuo de sensações, afetos e percepções que aparecem e se dissolvem incessantemente, sem querer agarrá-las ou rejeitá-las.

Para adquirir esta Consciência, é necessário um exercício de auto-observação, da escuta e da observação da realidade a sua volta. Afinal de contas, o Teatro é a mimese da realidade, seja apenas como simples representação, seja para subverter o sentido do que é realidade, pois mesmo para subverter, precisamos conhecer o que é real. Assim, o Ator é o observador/ouvinte de si mesmo e da realidade. E a consciência técnica deste corpo e desta voz que irá representar será adquirida através de treinamentos freqüentes para a descoberta deste "corpo em si", para transformá-lo em uma "massa de  modelar", que poderá se transmutar em vários corpos. No caso da voz, as mútliplas sonoridades e musicalidades poderão ser desenvolvidas.

Além disto, a presença cênica, a ação física e a prontidão dão ao ator a consciência e a técnica necessária (a partir do conhecimento prático e teórico das sonoridades e seus parâmetros do corpo e suas qualidades de movimento) para realizar o seu trabalho com qualidade e verdade cênica.

A voz é um gesto do corpo, gesto físico, pois atinge tanto tátilmente quanto auditivamente. A onda mecânica toca o corpo, a palavra e o som captado pelos ouvidos está carregado de imagens, signos e sentimentos. E tudo isto só acontece se o ator, através da técnica e da organicidade, estiver em estado de presença cênica e prontidão. 

Tenho assistido a alguns espetáculos em Goiânia, e os erros recorrem sempre no fato de "faltarem com a verdade", com a fé cênica, de buscarem a estética pela estética, e a forma pela forma. Buscam projeções, entonações e impostações falsas, sem nuances, sem compreensão dos parâmetros do som, organicidade e ainda com problemas de dicção.

A arte do ator, do intérprete cênico, é dar vida ao pensamento do autor. Interpretar, é compreender a fundo o sentido do que se está fazendo, é tornar orgânico, transmitir o texto ao espectador como se fosse pensado por si, sem necessitar falsetes, ou timbres completamente distantes. Atuar compreende uma função de agente da fala, poeta da ação, e como artista, dizer uma verdade que afeta o espectador, que mude o sentido de vida de cada um que participa do jogo da encenação.

Não há silêncio absoluto, há intervalos. Intervalos entre o pensamento e a ação, sempre preenchidos por uma pulsação ou respiração, pois tudo que é vivo respira e pulsa, toda a matéria vibra, e a vibração emite sons. Há o ar, o sopro. O silêncio é um gesto, é ouvir, escutar, pois antes da fala, vem o pensamento, vem a ação do outro, que desencadeia uma reação, que por sua vez gera outra ação, numa constante cíclica, que move o mundo, e no Teatro este mundo, subvertido, invertido, transmutado se configura como uma realidade única aos olhos do observador, atento, buscando todos os detalhes, e participando ativamente, em "silêncio" preenchido de emoções.

Compreender o silêncio não como um vazio ou pausa, mas como elemento do som, perceber o som como elemento a se manipular, preenchido de ação, emoção e nunca vazio e estático. Teatro é ação. E tudo o que se faz no palco é passível de significado e sentido, e deve estar preenchido pela verdade. Eis o que é um trabalho do ator, que é sempre compositor e agente transformador, ressignificante, e canal de ligação entre autor e diretor com a platéia.

Falar até papagaio consegue, imitar gestos um macaco pode fazer. Mas criar é algo estritamente humano, verdadeiro, e parte de um desejo. Afinal, por que somos atores?

terça-feira, 7 de junho de 2011

Ação Física Vocal

A Arte do ator, ao contrário do que muitos leigos pensam, é antes de mais nada, a arte da observação, da escuta. Segundo Valère Novarina (2009, p.21) “a fala nos foi dada não para falar, mas para ouvir”. Partindo deste príncipio o ator exercita o ato da escuta, e através dela a fala. O ator deve-se atentar ao texto dramático, na busca de entende-lo, de perceber as imagens, o pensamento do autor, para no palco ser o “porta-voz” deste pensamento, desta ideia, deste desejo de falar ou exprimir o pensamento. Além disto, o ator não é apenas um “emissor das palavras do autor”, mas também um agente criativo que criará suas próprias imagens sobre o Texto.

Falar é um gesto, uma vibração do corpo, que parte de um desejo com um determinado objetivo. Assim, poderíamos definir a voz também como uma ação física, que tem o poder de tocar e sensibilizar o outro, seja ele o espectador ou até mesmo um parceiro de cena. A voz, além da criação de imagens, é em si, através das sonoridades uma ação por si só, que independe do significado da palavra, mas que aliado a mesma tem o poder de multiplicar os signos e de extrapolar o inteligível, mas tocar no sentimento, no sensível.

Para desenvolver esta ação, o ator deve experimentar as diversas possibilidades em seu corpo, no intuito de perceber e tornar orgânico este processo e ultrapassar a simples hermenêutica do texto. Para Fernando Aleixo (2007, p.39) pode-se trabalhar esta ação física vocal a partir de “três dimensões fundamentais sendo: sensível, dinâmica e poética”.

Assim, para o ator ser o canal de conexão, o agente que liga o texto ao público, é necessário que perceba as sonoridades que as palavras possuem, desde o entendimento dos sons das letras até a construção do sentido de uma frase, buscando afetar-se e afetar o outro. Inclusive entender que o dramaturgo ou autor muitas vezes escolhe determinadas palavras pela sonoridade que possuem, a fim de impactar não apenas pelo signo em si, mas também pela forma auditiva.

Vale ressaltar que a ação física vocal, também se manifesta através do silêncio, da respiração vazia de sons mas preenchida de emoções e ação. É a muito conhecida “pausa dramática”, que como a própria expressão diz, é o silêncio que comunica e afeta o outro, que permite ao ator e espectador ouvirem a respiração do outro, a perceberem o desejo de manifestar o pensamento e sentir emoção. Além disto o silêncio permite a cadência da fala, a variação rítmica. O silêncio em si não existe, o que existe é uma transição entre falas, preenchidas de ruídos de ar, pulsação interior e desejo.

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Linguagem, Técnica e Voz

Falar de voz, técnica e linguagem isoladamente, sobre cada um destes tópicos já é por si só uma tarefa difícil e que renderiam grandes discussões sobre os temas. Falar sobre as três então..

Primeiro, devemos entender necessariamente do que se trata cada coisa. Quando falamos de Voz, estamos falando especificamente da capacidade humana de comunicar-se verbalmente por meio da fala, o que já nos remete quase que automaticamente ao conceito de linguagem.

A Linguagem por sua vez, é o tópico mais abrangente e contraditório desta discussão. Pois se considerarmos que a linguagem serve-se para comunicar, existem diversas linguagens, e é justamente as características específicas que compõem cada tipo de de linguagem. Daí, falar de linguagem, seria também enumerar os tipos de linguagem.

Consideremos que a linguagem aqui discutida é a linguagem artística, mais especificamente a linguagem teatral; isto é, se considerarmos que a arte é linguagem, e que o Teatro também é linguagem. Sendo assim, como qualquer outra forma de linguagem, o Teatro possui códigos e signos pré-estabelecidos entre os comunicadores (emissor e receptor), que facilitam a comunicação.

Porém a arte, diferente da linguagem normalmente usada no dia, que pretende comunicar de maneira mais clara e direta, se utiliza de funções diferentes, buscando outros meios de linguagem, através dos sentidos e das emoções, por exemplo.

É neste contexto que podemos inserir a noção de Técnica. Primeiramente, a palavra técnica surge com o significado de Arte (a tradução do grego techné é arte). A técnica é um conjunto de procedimentos que tem objetivo um determinado resultado.

Como a técnica não exclui a criatividade, muito pelo contrário, ela vem com um fator que contribui, a técnica no Teatro tem o intuito de facilitar a comunicação entre ator e espectador, fazendo com que o artista cênico, com domínio da técnica possa criar, através da sua voz e corpo, imagens e despertar em quem assiste sensações e sentimentos.

Assim a técnica na linguagem teatral é um agente catalisador desta comunicação, sendo um meio de conseguir comunicar ao espectador de forma mais objetiva e íntima. Na Voz, esta técnica, permite ao ator desenvolver vocalidades diversas, sons e entonações distintas, que fará com que este mesmo ator tenha um leque de possibilidades de criação, e que sua execução seja a mais próxima do ideal, no sentido da linguagem, que é comunicar. No caso da linguagem artística, comunicar direto com os sentidos, com os sentimentos.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Pontos cegos

Arte é mesmo algo subjetivo, apesar das técnicas, das teorias, Arte é o exercício da expressão do próprio ponto de vista. Arte é liberdade que aprisiona, amarra, fere e sara. Constrói, destrói, reconstrói e desconstrói.

Ser artista é falar o que não se deve, mesmo quando devemos falar e é necessário que se diga. Ser artista é ser. A arte é a construção do ser, e não ter. Aliás, ser ou não ser? A arte regenera, responde a tudo e inventa milhares de outras dúvidas. Escuro esclarecido, mórbido nascimento. Arte é ser Deus. Deus é criação. Arte é concepção.

Imagem e semelhança. Amor. Dor. Ser artista é esquecer de si mesmo e vangloriar-se de existir. É ser lenha do fogo da criação, pois a arte está acima de tudo, o artista é apenas o combustível, do qual o mundo não se movimenta sem. a Arte é mais importante do que o petróleo que nos patrocina, pois o automóvel não existiria sem o homem que também não existiria não fosse o outro homem que não existiria não fosse a mulher, que nenhum deles existiriam não fosse a arte.

Não há vida sem arte. A vida até existe sem arte, mas o sangue não corre e nem coração pulsa sem arte. Arte é prática. A prática é apenas teoria. A teoria é minha. Não é receita, é apenas um ponto de vista. E todo ponto de vista é a vista de um ponto. Ponto de interrogação.Talvez reticências reticentes, a arte tem sempre algo a mais para dizer, e que talvez não vamos compreender.

Arte não é educação. Arte é má-educação, arte é um corte abstrato no olho da humanidade cega, com suas facas e fés amoladas. Arte é mola propulsora. Um sim dotado de nãos que representa talvez. talvez a arte não exista, e nem eu.

Texto prolixo. Texto "pro" lixo. Escarro, vômito, caganeira, náusea. O fim do início, onde os meios não justificam os fins, mas nos faz compreender que viver não é necessário, o que é necessário é criar.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Just wanna be alone

Só, suspiros.
Chiados, espelhos, livros.
Trisco. Cisco, Careca, Frida, Baratas
Queimam no Sol de Porangatu.
Monólogos paralelos...


Abaixo um trecho de um texto de Pedro Bloch sobre o seu monólogos "As Mãos de Eurídice":


"Mostro o homem redoma, o homem isolado, o homem monólogo de nossos dias.
O homem de hoje não procura solução para os seus erros.
Limita-se a encontrar justificativas para continuar errando.
Não procura remédios, mas entorpecentes.
Uma vez encontradas as justificativas, ele restabelece um pseudo-equilíbrio emocional e persiste no erro até o momento em que se encontra só, absolutamente só, isolado em sua angústia, ilhado em seu desespero."

segunda-feira, 21 de março de 2011

Livro de Memórias

Nosso corpo é um livro de memórias, que registra todas as experiências pelas quais passamos em nossas vidas, em todas as suas fases, desde a infância até nossa velhice.

Qual de nós nunca percebemos quanto nossa voz lembra a dos nossos pais, irmãos? Além disso até a nossa própria aparência física se adapta aos que convivem conosco ao longo de nossas vidas; e não falo de parentes genéticos, mas sim de esposas, maridos, amigos...

Sendo assim, nosso corpo "material", físico, não é "construído" apenas geneticamente, e sim socialmente, culturalmente aliado às trasnformações biológicas. Somos uma "esponja do mundo', absorvendo tudo o que sentimos, e o nosso corpo transmite ao mundo estas experiências.

A voz talvez seja um dos grandes canais de comunicação que o nosso corpo tem para transmitir estas experiências que vivemos, até porque nossa voz é resultado de como nosso corpo se apresenta. registramos em nossas memórias o que é alegria, tristeza e como devemos expressar isto, sonoramente, fisicamente. E não fazemos, na maioria das vezes, de maneira consciente, e sim instintivamente.

Assim nossa respiração, voz, partem daquilo que sentimos e emitimos como sensação do que somos. No mundo todo, em cada região, pessoas terão timbres semelhantes entre si e que diferem do mundo todo, caracterizando a cultura de cada local, seu comportamento, entre outros

O ator deve buscar expandir suas experiências individuais e coletivas a fim de poder contar cada vez mais com um repertório ainda maior para composição vocal de seus personagens, que na maior parte dos casos possuem cultura diferente de seu intéprete. Além destas experiências, o ator precisa também adquirir um auto-conhecimento desenvolvido de seu corpo, para descobrir em si, onde estão registradas estas experiências e como experimentá-las praticamente.

A base de tudo, de onde parte tudo isto é a nossa respiração, o ar que adentra e que expiramos de nosso organismo interno. O conceito de Espírito está intimamente ligado à respiração, ao ar. A palavra Espírito deriva da palavra latina Sopro. Assim, a cada respirada, enchemos nosso organismo de experiências e colocamos nosso "espírito" para fora.

Gostaria de encerrar este texto citando um trecho de um texto de Voltaire que utilizo na encenação do solo "Tempo Esgotado" apenas a título de discussão sobre o controle que temos sobre nós mesmos e o conhecimento e a experiência que adquirimos ao longo da vida. Eis o trecho:

Surgem por todos os lados, pobre doutor. Queres saber por que o teu braço e o pé obedecem à tua vontade e por que o teu fígado não te obedece? Indagas como o pensamento se forma no teu tímido entendimento e como gera aquela criança no útero da mãe? Dou-te o tempo que queiras, para me responderes. 
O que é a matéria? Os teus colegas doutores encheram dez mil volumes sobre o assunto; descobriram nela algumas qualidades essenciais: as crianças conhecem – nas tanto como tu. Mas essa substância no fundo o que é? E a que é que chamaste espírito (termo cuja origem é palavra latina sopro, não podendo achar melhor conceito, por que não fazes a mínima idéia do que isso seja)?
Repara no grão de trigo que se lança a terra e dize – me por que brota depois do solo para produzir um canudo carregado com uma espiga. Ensina – me a razão por que a mesma terra produz uma maçã no alto dessa árvore e uma castanha na árvore vizinha. Podia arranjar um calhamaço recheado de perguntas, ás quais não deverias honestamente responder senão por quatro palavrinhas: não sei nada disso.
E, todavia és bacharel, és doutorado, possuis vários diplomas, e és togado. Chamam-te mestre. E esse orgulhoso pateta, nomeado para um modesto emprego numa cidadezinha, supõe ter comprado o direito de julgar e condenar aquilo de que nada percebe.

Teatro Religioso - instrumento de fé ou de Propagação?

É interessante pensarmos nesta discussão entre Teatro e Religião. Se pesquisarmos mais profundamente, veremos que o Teatro, tal como o conhecemos, deriva de um culto ao deus da mitologia grega Dioniso. Sendo assim, o Teatro tem em suas raízes, a função religiosa e por muito tempo esteve vinculada a tal manifestação.

Porém, ao passar do Tempo, o Teatro ganha uma dimensão muito grande, deixa de ser um instrumento de meios religiosos, e passa a ser por si só uma manifestação, assim como aconteceu com todas as formas de expressão artística. Tal ligação com a religião, faz inclusive que, parte do pensamento da população, tenha uma visão "romântica" da Arte e dos artistas, crendo que os mesmos tenham uma ligação direta com a(s) divindade(s).

Esta ligação, e o fato da Arte comover e comunicar de forma mais direta do que o simples discurso verbal, faz com que igrejas, empresas, políticos, entre outros, busquem na Arte, uma forma de comunicar com seu público de maneira mais ampla e profunda. E neste caso, o Teatro demonstra tal poder, por agrupar em si, diversas outras manifestações artísticas, como a Música, as Artes Visuais e a Literatura, além da dramatização.

Tive oportunidade de participar de apresentações Teatrais religiosas e de assistir. Penso que o Teatro deve ser diverso e variado, que aconteça em todos os espaços. O que não pode acontecer é a ditadura da linguagem. O Teatro pode e deve acontecer com temática religiosa, assim como também deve ser profano.

Existem excelentes trabalhos teatrais realizados por instituições religiosas, e eles também comunicam e emocionam pessoas, levantam discussões, assim como o Teatro desvinculado da religião o faz. A distinção muitas vezes está na profissionalização: o Teatro religioso não possui fins lucrativos diretos e os artistas envolvidos são pessoas da população que normalmente não vivem da Arte.

Bom, quando digo "Teatro Religioso", refiro-me primeiramente ao Teatro vinculado diretamente à instituições religiosas, e não Grupos independentes que praticam Teatro com temática religiosa. Entendo que a expressão "Teatro Religioso" é ampla e abrangente, mas também não temos nenhum termo ou estudo voltado diretamente para estas manifestações (pelo menos não tenho conhecimento de tais pesquisas).

A Arte tem a função de ser o canal de comunicação entre o que um artista deseja "falar" e o que o público quer "ouvir". O importante é que todos possam entender, de maneira crítica, que a Arte está acima de temas, filosofias e do próprio artista que a executa.

E quando cito o que o Teatro dentro da Igreja não tem intuito profissional, é porque o mesmo está vinculado á uma instituição que não possui fins lucrativos (pelo menos não deveria, pois é o que rege a lei e por isso não pagam impostos). Sendo assim, não há como ser profissional (ou seja cobrar do espectador, e portanto receber) estando ligado a tais instituições. O fato de ser profissional ou não, na minha opinião, de nada influi na qualidade dos trabalhos apresentados, não passando apenas de conceitos pré-determinados e legalmente judiciais.

Sendo assim, a Igreja é uma instituição sem fins lucrativos, porém o que vemos, seja na mídia, ou em casos notórios, diversas instituições religiosas possuem grandes patrimônios, e seus representantes estão cada vez mais abastados. Desta forma, muitas vezes os grupos de Teatro vinculados às igrejas fazem suas apresentações para que as instituições consigam mais seguidores, e que por consequência, consigam mais arrecadação. Só que, na maior parte, os atores dos grupos são membros da sociedade que desenvolvem outras profissões, e fazem o Teatro apenas como meio de louvor, e não recebem por isto, e o grupo é mantido pela arrecadação da Igreja. Assim sendo, o "lucro" direto não tem nenhum repasse feito aos "artistas".

O fato é que, em vários casos, o Teatro dentro da Igreja serve com artifício para alienação de seguidores. Porém não podemos esquecer que tais práticas não se aplicam à todas as instituições, pois há sim o Teatro Religioso com fins educativos e morais, a fim de divertir e conscientizar a o público. Mas ainda sim, proponho um questionamento: Não será ainda esta mesma forma uma alienação?

Entre ruas e calçadas

Andar, pensar, parar, observar.
"Para que tantas pernas meu Deus" - resmunga Carlos Drummond de Andrade. 
Pernas, braços e rostos. 
Anônimos na multidão de desconhecidos do nosso dia-dia. 
E eles são muitos, de todos os tipos e jeitos, classes e etnias. 
Felizes, apressados, gays, mulheres, gordos e magros. 
Assim eles passeiam na minha mente.

Assim eu os transfiro para meu corpo. 
Assim eu sou eles, e não sou ninguém. 
Sou e não sou. 
A cada passo um descompasso. 
Um fremir delicado de pés, cabeça, tronco, cortado por um súbito não. 
Este é o fim inevitável do artista. Ser muitos e esquecer de si mesmo.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Trilhos

Estático. Mudo. Fico sentado, inerte, em total silêncio íntimo, enquanto lá fora salpicos de chuva fazem uma música incidental. Nada acontece. Nada de novo. Novamente nada. Os peixes na minha mente vazia nadam num oceano de idéias mortas,

Saio da cadeira. Continuo na cadeia. O dia amanhece, mas continua tudo escuro. "Talvez seja sono!" Grita a consciência adormecida, bêbada, e nem um pouco indolente. Sinto uma enorme vontade de não sentir nenhuma vontade. Cruelmente, de forma paradoxal, a vida parece morta dentro de mim. Enquanto penso isto, Artaud sorri no inferno, ao lado de Sartre. O inferno não existe. Enquanto isto o verão mais parece um inverno. Continua chovendo.

Faz frio... Uma preguiça abraçou minha alma com suas garras potentes e não pretende me abandonar  tão cedo. Pelo menos tenho companhia. Talvez seja a mudança. É isto. Sair do lugar comum, da conveniência, da zona de conforto, do aconchego de um mausoléu mal-trapilhado que a qualquer momento desabaria sobre minha cabeça. Mas não. Ist seria apenas uma justificativa para o injustificável. Cara platéia, o que devo fazer agora neste palco? Um vídeo relatando minhas experiências corporais. O que mudou na minha vida?

Nada. Nada muda. Nada mudo, nenhum criado-mudo ou surdo. Jogo com a paciência um jogo de paciência. Enquanto isto, mil idéias e problemas precisam ser solucionados, mas os peixes apenas nadam. Peço ajuda a Artaud, mas ele apenas ri. Van Gogh amputa suas orelhas expressionistas,o que não me impressiona. A vida passa feito locomotiva numa tela de Van Gogh, ou num filme de Kurosawa. Rei Lear agora é japonês. Viva a globalização.

Devo ocupar-me de preocupações mais relevantes. Isto, levante-se! o mundo está lá fora, empoçado numa avenida suja, cheia de água desta chuva miserável que não para de cair. Eu só quero dormir, depois passa. Tudo passa. as uvas passas, as ameixas passas, até o ônibus passa. O tempo passa, marcando passos, idas e vindas. Olhei para o espelho e me assustei. Meu Deus! Há dez anos atrás eu era dez anos mais jovem. Que coisa mais abstrata. Como posso envelhecer tanto assim.

Já sinto saudades de todos os que morreram. Faz tanto tempo. Quero um pouco de colo... Quero torcer pelo Ayrton Senna. Quero ser feliz como uma criança tonta, que não via um mundo decadente, podre, pobre, sem dentes, nem pernas e nem bandeiras. Um mundo de faz - de conta que era faz-de-conta que eu dava conta de viver nele. Talvez seja apenas mais um monótono monólogo. 

Há uma foto lá em cima. É de uma peça de Teatro - Tempo Esgotado. Um homem está a beira de si mesmo, um abismo sem fim. talvez seja o fim. O fim talvez seja um início. O início sempre nos conduz ao fim. Quando começa o fim e quando termina o início? Quando estamos no meio? Maquiável, entra sem ser convidado, justificando os meios pelo fim.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Olhares

Um olho no meio da rua,
Na fechadura,
Vejo a rua,
Dura!

Dure enquanto durar,
Perdure ou pendure,
Estética, ética, cética,
A montagem começa desmontada...
Cabeça desmantelada.

Apenas experimento,
Apenas um experimento.