quinta-feira, 10 de março de 2011

Trilhos

Estático. Mudo. Fico sentado, inerte, em total silêncio íntimo, enquanto lá fora salpicos de chuva fazem uma música incidental. Nada acontece. Nada de novo. Novamente nada. Os peixes na minha mente vazia nadam num oceano de idéias mortas,

Saio da cadeira. Continuo na cadeia. O dia amanhece, mas continua tudo escuro. "Talvez seja sono!" Grita a consciência adormecida, bêbada, e nem um pouco indolente. Sinto uma enorme vontade de não sentir nenhuma vontade. Cruelmente, de forma paradoxal, a vida parece morta dentro de mim. Enquanto penso isto, Artaud sorri no inferno, ao lado de Sartre. O inferno não existe. Enquanto isto o verão mais parece um inverno. Continua chovendo.

Faz frio... Uma preguiça abraçou minha alma com suas garras potentes e não pretende me abandonar  tão cedo. Pelo menos tenho companhia. Talvez seja a mudança. É isto. Sair do lugar comum, da conveniência, da zona de conforto, do aconchego de um mausoléu mal-trapilhado que a qualquer momento desabaria sobre minha cabeça. Mas não. Ist seria apenas uma justificativa para o injustificável. Cara platéia, o que devo fazer agora neste palco? Um vídeo relatando minhas experiências corporais. O que mudou na minha vida?

Nada. Nada muda. Nada mudo, nenhum criado-mudo ou surdo. Jogo com a paciência um jogo de paciência. Enquanto isto, mil idéias e problemas precisam ser solucionados, mas os peixes apenas nadam. Peço ajuda a Artaud, mas ele apenas ri. Van Gogh amputa suas orelhas expressionistas,o que não me impressiona. A vida passa feito locomotiva numa tela de Van Gogh, ou num filme de Kurosawa. Rei Lear agora é japonês. Viva a globalização.

Devo ocupar-me de preocupações mais relevantes. Isto, levante-se! o mundo está lá fora, empoçado numa avenida suja, cheia de água desta chuva miserável que não para de cair. Eu só quero dormir, depois passa. Tudo passa. as uvas passas, as ameixas passas, até o ônibus passa. O tempo passa, marcando passos, idas e vindas. Olhei para o espelho e me assustei. Meu Deus! Há dez anos atrás eu era dez anos mais jovem. Que coisa mais abstrata. Como posso envelhecer tanto assim.

Já sinto saudades de todos os que morreram. Faz tanto tempo. Quero um pouco de colo... Quero torcer pelo Ayrton Senna. Quero ser feliz como uma criança tonta, que não via um mundo decadente, podre, pobre, sem dentes, nem pernas e nem bandeiras. Um mundo de faz - de conta que era faz-de-conta que eu dava conta de viver nele. Talvez seja apenas mais um monótono monólogo. 

Há uma foto lá em cima. É de uma peça de Teatro - Tempo Esgotado. Um homem está a beira de si mesmo, um abismo sem fim. talvez seja o fim. O fim talvez seja um início. O início sempre nos conduz ao fim. Quando começa o fim e quando termina o início? Quando estamos no meio? Maquiável, entra sem ser convidado, justificando os meios pelo fim.

Um comentário:

  1. João, parabéns pela sua entrega tão intensamente numa disciplina que até é dispensado!
    Você e Sol se merecem! Duas pessoas tão sensíveis e cheia de idéias!
    Você entendeu perfeitamente o espírito do nosso processo!!
    Continue! Precisamos muito de sua contribuição!
    Bjim,
    Lenita Caetano

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